Não bastasse lavar nossa alma com o merecidíssimo Oscar para “Ainda estou aqui” (mérito de Walter, Fernanda, Selton, Marcelo, Eunice e Rubens, entre tantos outros), a cerimônia da Academia deste ano foi marcada por uma curiosa tônica: o grande vencedor da noite – com poucas exceções pontuais – foi o cinema independente.
Senão vejamos. “Ainda estou aqui” foi a mais barata das produções na categoria de filme estrangeiro. “Anora”, que fez a festa faturando os prêmios de filme, atriz, direção, edição e roteiro original, custou a bagatela de US$ 6 milhões (se considerarmos que o budget médio de um filme americano hoje fica na casa de US$ 60-80 milhões). Não parou aí: com um pouco mais (US$ 10 milhões), “O Brutalista”, outro grande – inclusive na duração – filme autoral, levou as estatuetas de ator, fotografia e trilha sonora original.
O assunto é pouco orçamento? Então baixemos ainda mais: “A verdadeira dor”, de Jesse Eisenberg, que deu o prêmio de ator coadjuvante a Kieran Culkin, saiu do papel por meros US$ 3 milhões. E “Flow”, a maravilhosa animação da Letônia (e uma das minhas mais veementes torcidas, confesso), foi premiado tendo custado US$ 3,7 milhões, contra as fortunas torradas pelas Pixar e DreamWorks da vida em suas respectivas produções.
As poucas exceções pontuais incluem “Conclave” (roteiro adaptado), “Duna 2” (efeitos visuais e som), e “Wicked” (figurino e direção de arte) – que já eram de se esperar. Mas no cômputo final, o que a cerimônia desse ano sinalizou?
Se por um lado o Oscar é a vitrine de uma indústria, que preza a dinâmica financeira para a produção e a consequente obtenção de retorno e lucro, por outro seu corpo de votantes é composto por milhares de profissionais de todas as categorias e, portanto, o resultado reflete o que esses votantes esperam dessa indústria.
A edição de 2025 mostrou que se espera mais originalidade, em detrimento de sequências e da aversão ao risco. Mostrou também que a escrita, a direção, a interpretação e o foco da narrativa é que ditam o mérito de uma obra cinematográfica, ao invés da perspectiva de uma gorda bilheteria. Bilheteria é ótimo, sinalizou a Academia, mas mais importante ainda é o impacto em quem compra os ingressos.
Aliás, vários dos premiados, em seus discursos, bateram na tecla de que é necessário prestigiar o cinema nas salas de cinema (cutucada, óbvio, no streaming), onde, em termos de presença de público, a quantidade – pelo menos nesse caso – deve fazer par com a qualidade.
E foi a qualidade que deu as caras na cerimônia do Oscar desse ano. Que bom.
(Por Nelson Moraes, escritor e publicitário)